140: Violência de Gênero: o desafio do cuidado em território de contradições
Debatedor: A definir
Data: 31/05/2018    Local: ICB Sala 04 - Canarana    Horário: 13:30 - 15:30
ID Título do Trabalho/Autores
549 Notificações das situações de violência de gênero no território
Gabrielle da Rocha Guimarães, Simone Mendes Carvalho, Isabela Prauchner de Andrade, Carolina Piquet Alcantara de Mattos, Celly Paranhos Santos

Notificações das situações de violência de gênero no território

Autores: Gabrielle da Rocha Guimarães, Simone Mendes Carvalho, Isabela Prauchner de Andrade, Carolina Piquet Alcantara de Mattos, Celly Paranhos Santos

Introdução: A violência é um fenômeno sócio histórico que acompanha a humanidade desde seus primórdios. A violência de gênero apresenta-se de várias formas e atingem mulheres, crianças e homens, independente de idade, inserção social, raça/etnia e orientação sexual. Por afetar a saúde individual e coletiva, tornou-se um problema de saúde exigindo políticas públicas e ações específicas para sua abordagem. Objetivo: Levantar e caracterizar as notificações das situações de violência no território. Metodologia: Trata-se de um estudo qualitativo descritivo. Foi realizado um levantamento das notificações de violência realizadas pelas equipes que atuam na Estratégia de Saúde da Família no CMS Albert Sabin localizado na Rocinha/RJ, cenário da pesquisa. O levantamento feito refere-se aos anos de 2015 e 2016, totalizando 118 notificações. Para caracterização e diagnóstico das situações de violência, os dados foram separados de acordo com o território de residência da vítima e comparados ano a ano, levando-se em consideração o número total de notificações e o número total em cada território, considerando a complexidade e as diversidades sociais de cada território. Resultados: Foram analisadas 56 notificações em 2015 e 62 notificações em 2016 e identificados 10 tipos de violência, entre elas, física intra e extra domiciliar, sexual, psicológica, negligência/abandono, auto provocada e tentativa de suicídio. Dois tipos de violência, a física/psicológica/moral intradomiciliar e física intradomiciliar, se destacaram com maior prevalência nos 06 territórios estudados. A análise dessas notificações mostrou uma grande incidência de violência contra a mulher no território que o CMS abrange, o que influencia significativamente na saúde das mulheres violentadas. A maioria das notificações foi distribuída pela UPA Rocinha, Hospital Miguel Couto e Hospital Rocha Maia. Foi observado que nem todas as notificações possuíam encaminhamento, como orientação à vítima e denúncia do caso. Outro problema identificado foi a precariedade do preenchimento das notificações, como insuficiência de dados, informações ambíguas e dificuldade de entendimento da caligrafia. Outro fato é que existe uma lacuna entre as notificações dos tipos de violência nos territórios e o tipo de cuidado prestado às vítimas pelas equipes, que nem sempre é contínuo e resolutivo. A realidade do território brasileiro apresenta o tema da violência como um dos mais difíceis aspectos a serem enfrentados. Conclusões: A violência é um dos mais importantes problemas de saúde da atualidade e impõe ao sistema de saúde abordagens diferenciadas e complexas. Esse estudo evidenciou a necessidade de avanço na constituição das redes - serviços, atenção e cuidado em saúde. Ressalta-se a importância de uma capacitação dos profissionais das equipes no preenchimento das notificações e no cuidado longitudinal à mulher em situação de violência, de modo a garantir um cuidado integral e de qualidade.

788 Serviços de saúde, doença e violência: aspectos relacionados à saúde de travestis
Eronilson Juvenal de Araújo, Fabiana Regina da Silva Grossi, Adriane dos Santos Souza, Carlos André Nogueira Oliveira

Serviços de saúde, doença e violência: aspectos relacionados à saúde de travestis

Autores: Eronilson Juvenal de Araújo, Fabiana Regina da Silva Grossi, Adriane dos Santos Souza, Carlos André Nogueira Oliveira

Por um ser se assumir travesti, enfrenta inúmeras dificuldades que dificultam suas histórias de vida, tais quais, a expulsão do lar e a falta de apoio dos familiares, a desistência escolar em consequência da falta de preparo dos professores, para lidar com as questões da transgeneridade e a falta de respeito. Por essa não adequação à normatização do gênero de nascença, elas têm seus direitos básicos como ser humanos violados, e em muitos casos, encontram-se vulneráveis. O objetivo foi analisar os aspectos relacionados à saúde de travestis. Trata-se de um estudo bibliográfico em formato de revisão sistemática realizada a partir da análise de 18 artigos científicos selecionados dentre 28 trabalhos encontrados por mecanismos de buscas nas bases de dados: Lilacs, Medline e Scielo. Foram utilizadas como descritores a combinação de palavras: saúde e travestis. Como critérios de inclusão delimitou-se: ser do idioma português e espanhol, estar publicado nas bases de dados selecionadas em formato de artigos, bem como ter sido devidamente publicado entre janeiro de 2007 a outubro de 2017. Por outro lado, como critérios de exclusão buscou-se eliminar os artigos que não estavam disponíveis na íntegra, artigos repetidos nas bases de dados selecionadas, foram descartadas as publicações de conteúdo teórico e/ou reflexivo (não empírico) e/ou não condiziam com os objetivos propostos pela pesquisa. Evidenciou-se que no intervalo de 2007 até 2010, houve uma menor quantidade de publicações, representado por 22,20% da produção.  Já anos de 2011 a 2017, foram publicados mais artigos, referente a 77,80% das publicações. As fundamentais temáticas de pesquisa abordadas neste artigo foram selecionadas por categorias, sendo elas: Serviços de Saúde, com oito artigos (44,42%), Doenças, representada por sete obras (38,90%) e Violência, composta por três produções (16,68%). Ressalta-se que por estarem em um estado de vulnerabilidade emocional, social, financeira, etc., bem como por sofrerem violências físicas constantemente e por estarem, muitas das vezes, no trabalho informal (prostituição), as travestis dependem mais do atendimento a saúde, comparada a pessoas que não se encontra nesse estado de vulnerabilidade. Porém, observou-se a dificuldade enfrentada pelas travestis em fazer valer seus direitos enquanto cidadãos/ãs brasileiros/as. Visto que é o Sistema Único de Saúde (SUS) é regido pelo principio de integralidade equidade e universalidade, que de certa forma não é efetivamente cumprido na prática do dia-a-dia. Além disso, verifica-se a necessidade de mais ações que minimizem a violência sofrida por esse grupo, que reflete diretamente no processo saúde-doença.

833 Análise dos estudos sobre a violência doméstica contra a mulher: uma revisão sistemática da literatura
Suellen Conceição de Queiroz Santos, Fabiana Regina da Silva Grossi, Carlos André Nogueira Oliveira

Análise dos estudos sobre a violência doméstica contra a mulher: uma revisão sistemática da literatura

Autores: Suellen Conceição de Queiroz Santos, Fabiana Regina da Silva Grossi, Carlos André Nogueira Oliveira

A violência doméstica contra a mulher, seja física, sexual ou psicológica, tem sido considerada um grande problema social e global que afeta milhares de mulheres em todo o mundo, sendo resultado de diversos fatores que podem acarretar prejuízo significativos para as vítimas. O objetivo do presente trabalho foi analisar as publicações que tratam da violência doméstica contra às mulheres em seus diversos âmbitos. Trata-se de uma revisão sistemática da literatura realizada a partir da análise de 25 artigos científicos selecionados dentre 85 trabalhos encontrados por mecanismos de buscas nas bases de dados: Lilacs (Literatura Latino-Americana e do Caribe em ciências da saúde), Medline (Medical Literature Analysis and Retrieval System Online), incluindo os seguintes descritores “Violência doméstica” e “mulher”. Os critérios de inclusão foram: a) estar publicado nas bases de dados selecionadas em formato de artigos; b) ter sido publicado entre janeiro de 2015 a Abril de 2017. Os critérios de exclusão foram: a) não ter relevância para os objetivos do estudo; b) estudos não disponíveis na íntegra; c) publicações de caráter teórico e/ou reflexivo (não empírico); e d) artigos repetidos nas bases de dados selecionadas. Os resultados apontam que o ano de 2015 apresentou maior número de publicações, com quantidade expressiva de 20 artigos produzidos, enquanto que os últimos anos ficaram responsáveis por apenas 5 publicações. Sete artigos apresentam as principais características da Violência entre Parceiros Íntimos (VPI), na qual esse tipo de violência costuma ser mais abordada nos relacionamentos heterossexuais, tendo apenas a mulher como vítima e o homem como seu principal agressor. No entanto, os estudos mostraram que as violências físicas e emocional são as de maior proporção na VPI, resultado de um sentimento de posse e dominação masculina. Sete artigos citam a importância de redes de apoio e intervenções para mulheres que sofrem agressões dentro de casa, ressaltando que os serviços de saúde têm um papel relevante por serem, em muitos casos, o primeiro contato da vítima com as instituições públicas, devendo estes estarem prontos para o acolhimento das vítimas. Quatro artigos analisam a qualidade de vida de mulheres expostas à violência doméstica durante a gravidez e apresenta números expressivos de casos, requerendo uma ação urgente por parte das equipes de cuidados primários de saúde, pois, foi constatado que durante a gestação as agressões destas mulheres são maiores, tornando-se preocupante para a prevenção por ser uma fase vulnerável. Dois artigos afirmam que a intervenção judicial não é suficiente para inibir a violência contra a mulher e tampouco para a resolução dos conflitos existentes, ou seja, embora a lei Maria da Penha hoje se encontra instituída, percebe-se que a intervenção judicial não é suficiente para a resolução dos conflitos existentes. Conclui-se que a violência doméstica é reflexo ainda de uma sociedade machista, na qual inclui fatores como: ciúme, sentimento de posse, uso de drogas e questões socioeconômicas. Nesse sentido, os estudos apontam a necessidade de novas medidas, como a adoção de outras saídas para enfrentamento e empoderamento da mulher.

1057 Impacto de ações de intervenção para prevenção da violência no namoro
ROSANA ALVES DE MELO, FLAVIA EMÍLIA CAVALCANTE VALENÇA FERNANDES, KARINA PERRELLI RANDAU

Impacto de ações de intervenção para prevenção da violência no namoro

Autores: ROSANA ALVES DE MELO, FLAVIA EMÍLIA CAVALCANTE VALENÇA FERNANDES, KARINA PERRELLI RANDAU

Apresentação: A violência no namoro pode ser definida como qualquer comportamento destinado a controlar ou dominar o(a) parceiro(a), por meios físicos, psicológicos ou sexuais, gerando sofrimento e danos para a saúde e o desenvolvimento dos indivíduos. Pode ocorrer em relações de curta ou longa duração, e se con­figura como um precursor da violência intrafamiliar, assim como tem sido documentada sua ocorrência tanto em casais heterossexuais quanto em casais homoafetivos, ainda que esse contexto seja, comparado ao anterior, pouco investigado ainda. É considerada uma questão de saúde pública, com o potencial de impactar de forma negativa na saúde física e mental de todos os envolvidos. Os fatores de risco associados a essa problemática podem estar associadas a experiências prévias de vitimização e exposição à violência, como presenciar situações de violência entre os pais; ser vítima de maus-tratos pelos responsáveis; ter amigos vivenciando relações violentas; e aceitação e justificação da violência como algo possível e natural entre os parceiros. A violência no namoro está sendo um pouco mais discutida na atualidade, apesar de ter sido muito tempo negligenciada das discussões, enquanto possível forma de relação abusiva entre adolescentes, uma vez que só se reconhecia como racionamento abusivo a violência existente entre parceiros íntimos adultos, porém, ainda é mais amplamente discutida internacionalmente. Diante das diversas consequências negativas associadas a perpetuação da violência afetiva, vem crescendo o planejamento e a implementação de programas de prevenção na violência no namoro, sendo destinados a grupos de adolescentes e jovens, frequentemente, em ambiente escolar e universitário, independente do seu grau de exposição a riscos para violência no namoro, visando mostrar a esses indivíduos a gravidade da violência e educa-los acerca de comportamentos não violentos na intimidade, como forma de diminuir a probabilidade de se tornarem futuros agressores ou vítimas. Dessa forma, este estudo teve como objetivo analisar o impacto de ações de prevenção da violência nas relações de namoro na adolescência. Desenvolvimento do trabalho: Trata-se de uma revisão integrativa da literatura, realizada por meio de busca avançada na Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), o que nos permitiu explorar as bases de dados Literatura Latino-Americana em Ciências da Saúde (LILACS) e Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (Medline), além de acesso a Scientific Electronic Library Online (SCIELO). Os critérios de inclusão foram: publicações dos últimos seis anos, enfatizar ações implementadas para prevenção da violência no namoro adolescente, possuir conteúdo completo disponível, estar nos idiomas inglês, português ou espanhol. Adotou-se a busca booleana para a pesquisa na BVS com os seguintes descritores: “violência no namoro” AND “prevenção” AND “adolescência”. A busca no SCIELO utilizou os termos: “violência”, “namoro” e “prevenção”. A pesquisa foi realizada no mês de outubro de 2017. Foram encontrados 08 artigos e após a leitura dos resumos, foram incluídos na amostra quatro artigos. Resultados e/ou impactos: As atividades de prevenção realizadas com o intuito de conscientizar os adolescentes sobre relações de namoro livres de violência, mostram-se eficazes dentro desse contexto. No primeiro artigo analisado, observou-se que as atividades de extensão realizadas com adolescentes escolares, visando prevenção de violência afetiva, se mostrou bastante eficaz, porém, quando realizadas de forma participativa, abordando habilidades sociais, conhecimentos sobre os diversos tipos de violência existentes no namoro, assim como atitudes e crenças relativas a papéis de gênero. Em contrapartida, a abordagem feita através de programas de prevenção meramente informativos, se mostraram pouco eficazes, levantando a necessidade de implementações multicomponentes, com a participação efetiva do grupo alvo, tudo isso sendo avaliado em momentos pré e pós intervenção, como forma de avaliar seu impacto. Assim, observa-se que intervenções com enfoque na construção de habilidades sociais, de manejo das emoções e resolução de conflitos, bem como com questionamentos sobres os papéis de gênero e troca de informações sobre violência no namoro, no sentido de capacitar os adolescentes sobre como manejar conflitos interpessoais sem agressão e fortalecimento de seus vínculos afetivos, se mostram bastantes efetivos nessa construção. Além dos achados trazidos até aqui, encontrados também na segunda publicação analisada, viu-se que a abordagem trazida incluía informações sobre direitos sexuais e reprodutivos e o empoderamento do casal, considerando a particularidade de cada um. A metodologia usada nesse estudo, envolveu a intervenção por um tempo de oito meses, sendo que a avaliação do impacto das intervenções realizadas só se deu ao final de todas as atividades realizadas. No pós teste, evidenciou-se que, apesar de não ter havido intenção de enfrentamento à violência no namoro e regulação emocional em nenhum dos dois gêneros, houve o aprendizado de autocontrole e expressão emocional, assertividade e empatia sobre questões que envolvem a afetividade do casal. Tais evidências são positivas e indicam uma redução em crenças estereotipadas sobre papéis de gênero masculinos, este como um dos fatores de risco para violência entre os pares. O terceiro artigo analisado, sumariza sua discussão na ideia de que as atividades de extensão/intervenção é fator importante na mudança de comportamento, crenças e atitudes que suportam a violência no namoro. Entretanto, levanta o dado de que, mesmo mostrando a eficácia das atividades de extensão na prevenção de violência nas relações de namoro na adolescência, essas intervenções ainda são poucos enfatizadas e realizadas na nossa realidade. Este estudo também mostrou que o papel dos facilitadores das ações é de extrema importância, considerando que os mesmos devem estar despidos de (pre)conceitos e estarem abertas não somente para discutir essa temática, mas para a troca de experiência e ideias que possam consolidar o aprendizado e favorecer a desmitificação de atitudes violentas. Por fim, um estudo realizado com o intuito de avaliar a metodologia dos programas de intervenção em adolescentes, evidenciou o mesmo que já vem sendo trazidos por outros estudos com o mesmo enfoque, que as atividades de extensão são consideravelmente importantes na conscientização e diminuição dos casos de violência no namoro, porém, é necessário um aprofundamento maior do tema por parte dos facilitadores, bem como a instituição de metodologias de implementação mais rigorosas, centrada na mudança efetiva de condutas por parte dos envolvidos. Considerações finais: Ao passo que está sendo evidenciado por alguns estudos a importância de ações de extensão na prevenção de violência no namoro, enfatiza-se a necessidade de estudos que mostrem a prevalência e incidência de violência nas relações amorosas de adolescentes e jovens, sobre os contextos e significados atribuídos a esta experiências e sobre as repercussões da mesma, na vida de todos os envolvidos. Isso favoreceria a ampliação de metodologias inovadoras que envolvessem diferentes modelos de prevenção e que avaliassem adequadamente a sua eficácia e seu impacto. No plano escolar/acadêmico, torna-se importante realizar um maior investimento na formação dos agentes educativos, assim como criar espaços para refletir sobre o tema das relações íntimas, promovendo de modo transversal modelos de interação positivos, para que as mudanças de atitude diante do problema da violência no namoro possam ser viabilizadas e consolidadas.

1422 ATUAÇÃO ÉTICA DA ENFERMAGEM FRENTE À VIOLÊNCIA SEXUAL E DOMÉSTICA, RELATO DE CASO
Camilla Cristina Lisboa do Nascimento, Aliny Cristiany Costa Araújo, Diully Siqueira Monteiro, Igor Kenji Yamamoto Souza, Pablo Cordovil Lobato dos Santos, Regiane Camarão Farias, Marcos José Risuenho Brito Silva, Thiago do Reis de Oliveira Costa

ATUAÇÃO ÉTICA DA ENFERMAGEM FRENTE À VIOLÊNCIA SEXUAL E DOMÉSTICA, RELATO DE CASO

Autores: Camilla Cristina Lisboa do Nascimento, Aliny Cristiany Costa Araújo, Diully Siqueira Monteiro, Igor Kenji Yamamoto Souza, Pablo Cordovil Lobato dos Santos, Regiane Camarão Farias, Marcos José Risuenho Brito Silva, Thiago do Reis de Oliveira Costa

APRESENTAÇÃO: A violência é o uso intencional da força física ou do poder, real ou em ameaça contra si próprio, contra outra pessoa, ou contra um grupo ou uma comunidade, que resulte ou tenha possibilidade de resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de desenvolvimento ou privação de liberdade.  A violência de gênero é um problema mundial ligado ao poder, privilégios e controle masculinos. Atinge as mulheres, independente de idade, cor, etnia, religião, nacionalidade, opção sexual ou condição social. O efeito é, sobretudo social, pois afeta o bem-estar, a segurança, as possibilidades de educação e desenvolvimento pessoal e autoestima das mulheres. A atenção às mulheres em situação de violência sexual e doméstica é considerada uma questão de saúde pública e um direito humano das mulheres pela Organização Mundial de Saúde, desde 1993. As mulheres precisam ser ouvidas e acompanhadas nos serviços de referência até que estejam preparadas para retomarem as suas vidas sem o sentimento de culpa pela exposição ao ato violento. Existem normas técnicas do Ministério da Saúde, bem como os Códigos de Ética que orientam os profissionais e regulamentam as condutas ética e legal. A Ética pode ser entendida como uma reflexão sobre comportamentos humanos, de uma maneira diferente do que fazem os psicólogos, os sociólogos, os biólogos ou outros estudiosos do comportamento humano. Quando abordada sobre a ética com o profissional de enfermagem, deve ser destacado que a mesma é uma profissão baseada no cuidado e bem estar dos indivíduos, com base nos direitos humanos das relações interpessoais. Isto é, falar de ética profissional na enfermagem é relacionar a qualidade dos serviços prestados por esse profissional. Nessa perspectiva, a atenção ao cuidado integral à mulher é pactuada aos princípios básicos do Sistema Único de Saúde na qual aborda um protocolo para a sistematização da assistência. Neste trabalho tem como objetivo relatar as condutas de enfermagem frente a um caso de violência sexual e doméstica em paciente obstétrica e para tal, será trabalhada a aplicação do manual para atendimento às vítimas de violência na rede de saúde pública e as taxonomias de NANDA Internacional (NANDA-I), Nursing Outcomes Classification (NOC) e Nursing Interventions Classification (NIC), resultando em uma eficaz atuação do profissional de enfermagem frente à violência sexual e doméstica. DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: Trata-se de um estudo descritivo de abordagem qualitativa, tipo relato de caso, pois visa analisar os dados e observações percebidas no decorrer da pesquisa em campo de prática. Nesse tipo de estudo, o pesquisador observa e explora os aspectos de uma situação. Objetiva, principalmente, o retrato preciso das características dos indivíduos e situações na qual estão envolvidos. As observações desenvolvidas neste trabalho foram direcionadas a uma paciente obstétrica, vítima de violência sexual e doméstica, que retornou a triagem obstétrica e ginecológica no hospital referência, em outubro de 2017. A coleta de dados ocorreu no dia 28/09/2017. Para tanto foi utilizado exame físico, consulta ao prontuário e conversa com a paciente. Na busca ativa no prontuário, foram coletadas informações como história clínica pregressa e atual, além das evoluções durante a sua gestação. A participante aceitou espontaneamente e assinou o termo de consentimento livre e esclarecido. Foi orientado quanto à importância do estudo, realização e confidencialidade das informações, conforme o preconizado pela Resolução No. 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, que se refere aos aspectos éticos para pesquisas que envolvem seres humanos. Com o intuito de identificar a melhor forma de assistência à usuária supracitada, foi utilizado o manual para atendimento às vítimas de violência da rede de saúde pública com foco em violência sexual e doméstica, além das definições dos diagnósticos, resultados e intervenções de enfermagem à partir das taxonomias do NANDA-I, NOC e NIC. RESULTADOS: Gestante, 19 anos, retorna ao serviço com queixa de visão turva, dor moderada no baixo ventre e sangramento transvaginal de pouca quantidade na manhã de hoje. Usuária secundigesta, um aborto provocado por violência doméstica, atualmente em gravidez de +/- 12 semanas, paciente vítima de violência sexual e doméstica, relata ter sido agredida pelo companheiro há menos de 48 horas, com quem vive maritalmente há 7 anos em situação frequente de humilhação, agressão física, com documentos confiscados/danificados pelo companheiro e evidente vulnerabilidade social. O caso foi encaminhado ao serviço psicossocial desta instituição de acordo com fluxograma de atendimento a vítima de violência. A partir destas constatações, foi elaborado um fluxograma de atendimento à mulher vítima de violência sexual e doméstica no qual o primeiro passo foi à identificação de sinais sugestivos de violência e situações de risco, o segundo passo foi à notificação e registro de casos suspeitos e o terceiro passo foi o acolhimento e assistência. neste terceiro passo a usuária foi orientada dentro das definições dos diagnósticos, resultados e intervenções de enfermagem à partir das taxonomias do NANDA-I, NOC e NIC. A partir dos problemas identificados, os principais diagnósticos de enfermagem, pelas taxonomias do NANDA-I,  voltados à violência sexual e doméstica foram: risco do binômio mãe-feto, medo e risco de dignidade humana comprometida. Por meio dos diagnósticos obtidos, os principais resultados de enfermagem, por meio o NOC, voltados a esta problemática foram: Cessação de Abuso, Integridade Familiar e Estado Materno: Pré-Parto. A partir disso, elaboraram-se intervenções, com base no NIC, de acordo com os recursos disponíveis no quais se destacaram: apoio emocional, apoio à proteção contra abuso: parceiro no lar, apoio à tomada de decisão e cuidados no pré-natal. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Dentre os cuidados de saúde, é de grande relevância a aplicação do manual para atendimento às vítimas de violência na saúde pública, por permitir ações que auxiliem as usuárias quanto às informações referentes à sua condição de saúde biopsicossocial e espiritual, bem como direcionar as intervenções preconizadas. A usuária relatada é um exemplo da importância da aplicação em questão, visto que a mesma demonstra a necessidade de uma assistência multiprofissional  na assistência integral, frente ao acompanhamento nos casos de violência sexual e doméstica, direcionada à reversão da situação de risco em que se encontra.  Nota-se que a enfermagem é de extrema importância quanto ao acolhimento, cuidado e intervenções relacionadas à problemática supracitada, no sentido de acompanhamento, apoio e empoderamento da mulher frente à violência sofrida em suas diversas variáveis e o atendimento de enfermagem se dá por meio de sistemas, que são definidos conforme a necessidade do usuário. Sendo assim, é notório que a capacitação dessa usuária quanto à tomada de decisões referentes a sua condição, contribui para sensibilização da mesma quanto a manutenção de um quadro gestacional adequado.

1578 MOTIVAÇÃO DA VIOLÊNCIA PERPETRADA CONTRA MULHERES
Flávia Emília Cavalcante Valença Fernandes, Rosana Alves de Melo

MOTIVAÇÃO DA VIOLÊNCIA PERPETRADA CONTRA MULHERES

Autores: Flávia Emília Cavalcante Valença Fernandes, Rosana Alves de Melo

Apresentação: A violência contra as mulheres, em especial aquelas praticadas por parceiros íntimos, é um grave problema de saúde pública e viola os direitos humanos podendo levar a resultados como a morte por homicídio ou até mesmo suicídio. Segundo a Organização Mundial da Saúde, aproximadamente 38% dos homicídios de mulheres em todo o mundo são praticados por parceiros íntimos. Em um período compreendido entre 1980 e 2010, foram assassinadas no Brasil aproximadamente 91 mil mulheres sendo as armas de fogo os principais instrumentos utilizados pelos agressores. Fatores individuais e macroeconômicos podem estar associados às situações de violência letal quando em um contexto geral. No caso de contextos individuais relacionado à violência contra a mulher, a escolaridade e fatores como vivências anteriores de situações de violência, uso de álcool e outras drogas, dentre outros, podem apresentar-se como fatores de risco para a perpetração da violência. Entretanto, questões macroeconômicas analisadas por meio de indicadores como o Índice de Gini aparecem como associados à elevadas taxas de homicídio quando analisada em uma perspectiva geral. A violência letal praticada contra as mulheres ganhou destaque no Brasil a partir de 2015, em especial no ordenamento jurídico quando teve uma qualificadora acrescentada no Código Penal Brasileiro em se tratando de crimes praticados contra mulheres relacionando à motivação tornando um crime hediondo. A importância da definição do feminicídio no arcabouço teórico e legal no Brasil tem uma perspectiva de chamar atenção para a necessidade de conhecer sua dimensão permitir a ideia de desnaturalizar concepções e práticas enraizadas nas relações pessoais e instituições que corroboram a permanência da violência fatal contra as mulheres em diferentes realidades.      Apesar dos diversos estudos apresentarem os índices da violência, em especial, a violência praticada contra mulheres mostrando também os fatores de risco relacionados, poucos estudos abordam de forma clara a motivação dos crimes praticados contra as mulheres. Neste contexto, este estudo teve como objetivo analisar a motivação da violência perpetrada contra mulheres. Desenvolvimento do trabalho: Trata-se de uma revisão integrativa da literatura por meio de uma análise qualitativa a partir de busca nas principais bases de científicas disponíveis. Utilizou-se a busca avançada da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) para acesso às bases Literatura Latino-Americana em Ciências da Saúde (LILACS), Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (Medline), Index Psicologia Periódicos e a Índice Bibliográfico Español em Ciencias (IBECS). Além do acesso a Scientific Electronic Library Online (SCIELO). Os critérios de inclusão para seleção dos artigos foram: publicações dos últimos cinco anos, apresentar as motivações para a violência perpetrada contra mulheres, possuir conteúdo completo disponível no formato online, estar nos idiomas inglês, português ou espanhol, ser artigo como tipo de publicação. Adotou-se a busca booleana para a pesquisa na BVS com os seguintes descritores: “violência contra a mulher” AND “motivação”.  A busca no SCIELO utilizou os termos: “violência”, “mulher” e “motivação”. O gerenciador de referências Mendely foi utilizado para análise e organização do trabalho. A pesquisa foi realizada nos meses de setembro e outubro de 2017. Foram encontrados 13 artigos e após a leitura dos resumos, foram incluídos na amostra três artigos por se adequarem ao objetivo proposto e atenderem aos critérios estabelecidos. Resultados e discussão: Centenas de mulheres são assassinadas no Brasil por seus parceiros íntimos, caracterizando a violência contra a mulher como um problema social e cultural. As pesquisas que abordam a motivação da violência praticada contra mulheres seja ela letal ou não letal trazem informações relevantes mostrando a ótica do agressor. Dos artigos analisados, um apresentou metodologia qualitativa, outro quantitativa e outro método misto de análise. O primeiro artigo objetivou colaborar no entendimento sobre os crimes passionais, investigando as percepções de sujeitos que cometeram esses crimes contra mulheres. Foram entrevistados sujeitos apenados sendo homens na faixa etária de 35 a 49 anos. As principais motivações na percepção do agressor sobre crime foram: o controle sobre a mulher, problemas relacionados às famílias de origem, traição, autopercepção, culpa, medo do abandono e perspectivas para o futuro. Perspectiva importante identificada nos discursos dos agressores foi a vivência em contextos familiares violentos assim como situações de abandono por parte da família. Fatos esses que podem ter influenciado as situações conjugais violentas. Aspectos como ciúmes e possessão estavam presentes nos relacionamentos conturbados estabelecidos com suas companheiras em todos os momentos e situações da vida conjugal foram verificados no estudo. Ademais, a traição ou o medo de ser traído também surgiu como um ponto crítico nos casos abordados pelos autores. O segundo estudo traz uma perspectiva quantitativa do homicídio conjugal realizado em Florianópolis a partir da análise de 29 processos criminais no período de 2000 a 2010. O tipo de violência analisada pela pesquisa foi a violência letal trazida pelos autores como homicídios conjugais. Em uma perspectiva geral, os autores apontam para uma predominância de casos cometidos por agressores do sexo masculino. O vínculo entre o agressor e a vítima de maior recorrência foi a separação de corpos o qual também se configurou como a principal motivação encontrada para efetivação do crime. Um aspecto relevante identificado pela pesquisa foi a história anterior de violência entre a vítima e o agressor. Homicídios femininos cujos perpetradores eram mais velhos houve uma maior utilização de arma de fogo. Contudo, quanto menor a idade do agressor e da vítima, maior foi a probabilidade de o meio utilizado ser um objeto perfuro cortante. O local de ocorrência dos crimes também foi relatado no artigo e aponta que a maioria dos casos ocorreu na residência da vítima, do agressor, ou de ambos. Importante notar que 44,8% dos casos em que o ato violento ocorreu em outros locais, houve predominância dos ambientes de trabalhos das vítimas. Os autores da terceira pesquisa utilizam uma metodologia mista de análise para investigar a motivação da violência conjugal segundo os depoimentos de homens e mulheres registrados nos inquéritos policiais (IP) em Florianópolis, Santa Catarina, em 2010. Foram analisados 172 IP. O tipo de violência investigada no artigo foi a violência doméstica praticada pelo companheiro ou ex-companheiro. Assim como no estudo anterior, os autores também identificaram que a maioria dos casais eram separados ou divorciados com idade entre 31 e 40 anos e período de convivência de até onze anos. As principais motivações para as agressões foram ciúmes associados ao uso de drogas. Chama atenção a percepção dos homens agressores de culpabilização, ou tentativa de minimização da situação, das mulheres pelos atos violentos praticados por eles alegando também serem vítimas de violência por suas companheiras. Os autores reforçam a tese da influência de questões culturais de gênero e socioeconômicas na problemática da violência praticada contra as mulheres. Considerações finais: Diante dos artigos analisados observou-se a presença da relação doméstica entre a vítima e o agressor. O ciúme e sentimento de posse foram motivadores para o crime. Ponto importante é que muitos dos crimes ocorreram quando medidas como separação de corpos já haviam sido tomadas assim como vivências de outras formas de violência contra a mulher foram identificadas. Os estudos analisados no presente artigo ratificam as questões discutidas acerca da violência contra a mulher em especial no tocante à recorrência da violência doméstica perpetrada por parceiro íntimo principalmente pelas motivações levantadas pelos estudos.

4335 Considerações sobre a importância do Serviço de Atendimento às Vítimas de Violência Sexual como um dispositivo necessário para a superação da desigualdade de gênero no interior do Amazonas
Clara Arruti Reis, Adrielli Pereira Santos

Considerações sobre a importância do Serviço de Atendimento às Vítimas de Violência Sexual como um dispositivo necessário para a superação da desigualdade de gênero no interior do Amazonas

Autores: Clara Arruti Reis, Adrielli Pereira Santos

O presente relato explana o trabalho do Serviço de Atendimento às Vítimas de Violência Sexual do município de Manacapuru/AM. Trata da implantação do referido serviço no Brasil, seus marcos legais, seu funcionamento no município em questão, e tece considerações a respeito da importância política destes serviços como um dispositivo que possibilita a produção de outros modos de subjetivar as relações de gênero além da naturalização da violência sexual e da desigualdade de gênero. A partir da observação de como as mulheres são tratadas em alguns serviços de saúde do município, do lugar social que ocupam na vida cotidiana e na herança histórica das populações que aqui habitam, foi possível identificar a naturalização de um conjunto de práticas que as subalternizam, tendo como exemplo extremo a violência sexual em todas as fases do ciclo vital. Diante disso, o Serviço de Atendimento às Vítimas de Violência Sexual vinculado ao Hospital Geral ocupa um lugar político maior do que apenas prestar atendimento emergencial para as vítimas de violência sexual - mulheres na sua maioria - a fim de restabelecer a sua saúde física. Ele tem se produzido, também, como um dispositivo que possibilita a subjetivação de outros modos de ser mulher neste contexto, de outros modos de (re)existir às violências de gênero naturalizadas, institucionalizadas e, consequentemente, contribuir para a superação da desigualdade de gênero no município. Através do acolhimento das vítimas e seus familiares que acessam o serviço - com uma escuta psicológica qualificada - e da articulação Intersetorial com a rede de assistência jurídica, social e de saúde, tem se mostrado possível que estas mulheres possam, muitas vezes pela primeira vez, localizar a violência como uma conduta que as fere profundamente e que tem raízes antigas – há casos em que todas as gerações de mulheres de uma mesma família sofreram violência sexual, mas nunca denunciaram ou buscaram ajuda na rede de assistência ou nos recursos da própria comunidade. A possibilidade de ser acolhida em um serviço de atenção específico para esta população cria condições para que as mulheres possam localizar a violência sexual em outro campo, não mais apenas compreendida como inerente à sua condição de fêmea humana, liberando a subjetividade da condição de prisão que esta situação invariavelmente impõe na experiência da mulher. O dispositivo se coloca assim como agente irruptor da realidade naturalizada da violência. Deste modo, o Serviço de Atendimento às Vítimas de Violência Sexual do município tem possibilitado uma fissura na continuidade geracional de violências de gênero. Esta fissura, em muitos casos, proporciona conquistas subjetivas inéditas dentro da comunidade que apontam para uma autonomia por parte da mulher e compreensão da violência sexual como um crime, endereçando esta aos órgãos competentes, cumprindo dessa forma com uma importante função política na superação da desigualdade de gênero no município.

4359 Criação de futuro e construção de cidadania entre articulação social e acompanhamento terapêutico de mulheres vítimas de violências e vulnerabilidades.
Károl Veiga Cabral, Márcio Mariath Belloc

Criação de futuro e construção de cidadania entre articulação social e acompanhamento terapêutico de mulheres vítimas de violências e vulnerabilidades.

Autores: Károl Veiga Cabral, Márcio Mariath Belloc

Neste trabalho vamos contar histórias vividas durante o desenvolvimento do Projeto Redes III em Porto Alegre. Durante o nosso trabalho, percorremos um território visível e geograficamente demarcado, mas também compartilhamos os territórios existenciais daquelas com quem dialogamos ao longo desse processo. Apoiados na metodologia do etnógrafo, a partir das narrativas das informantes, chegamos às dinâmicas relacionais presentes em cada território para propor uma intervenção capaz de atender as demandas das mulheres vítimas de violências e vulnerabilidades na cidade de Porto Alegre. É a partir das histórias dessas mulheres que encaramos o desafio de acompanhá-las, na perspectiva de encontrar junto com elas pontos de ancoragem, desenhar possibilidades, construir pontes para a saída do circuito de violência. O imenso desafio estava também na corrida contra o tempo, trabalhando com um tempo outro. Tempo de prontidão de cada uma dessas mulheres para viver essa história e reescrevê-la de uma outra maneira. Também é um tempo outro para os serviços engessados nas condutas do cotidiano e no modo clássico ofertado de produzir saúde. Exigiu de cada um de nós uma disponibilidade de estar junto, compondo com as equipes já presentes em território para, junto com as mulheres, nos lançarmos nesse trabalho e garantir o cuidado longitudinal – o Redes entra e sai dos territórios acionados, mas a rede com suas equipes permanece. Nossa equipe em Porto Alegre era formada por um coordenador de território, três supervisorxs e cinco articuladorxs sociais. O trabalho dxs articuladorxs sociais do Redes em território teve como ferramenta primordial a modalidade do acompanhamento terapêutico (AT). O AT como ferramenta nos oferece uma possibilidade única de circulação, uma disponibilidade para circular entre espaços instituídos e o fora, uma disponibilidade para o encontro com o outro através de um contrato ético relacional, pautado na busca da autonomia e de protagonismo do acompanhado. O AT tem como premissa fazer com o acompanhado, e não fazer pelo acompanhado, respeitar seus desejos e seu ritmo, bem como suas possibilidades, além de não fazer um julgamento moral do tipo de vida que o sujeito leva, mas tentar intervir para que o mesmo possa viver melhor, com mais qualidade de vida com suas escolhas. Coube ao articulador social adentrar ao território e aproximar-se dos serviços ofertando-se para acompanhar as mulheres. Estas foram acessadas a partir do encontro com os serviços e dispositivos comunitários, a partir do qual se construiu a demanda de AT. É nessa pactuação que foram encontradas as pessoas que se beneficiaram desta prática. Uma vez munidos destas informações, cada articulador(a) social buscou formas de se aproximar das mulheres, através da relação já estabelecida delas com as equipes e serviços. Não obstante, também atuaram a partir de uma busca ativa em território, sempre articuladxs junto com as equipes, para acessar as mulheres que não constituíram vinculação com a rede. Os acompanhamentos se desenvolveram no tecido social, permitindo-nos auxiliar as mulheres na busca de acesso a cuidados e direitos. Acompanhamentos que passaram por conhecer seus itinerários terapêuticos e de vida, conhecer melhor as dificuldades de acesso e as dificuldades que encontram em seus cotidianos para saírem do circuito de violências. Acompanhamentos que buscaram não cair na armadilha de reduzir a experiência destas mulheres a um olhar biomédico, dando possibilidade para enunciarem suas verdades, inclusive dos saberes oriundos do próprio sofrimento. Observa-se nos serviços, certa falta de espaço para a palavra, tanto de quem cuida quanto de quem é cuidado. Palavra muitas vezes secuestrada ou colonizada pelo discurso biomédico hegemônico. Muitas vezes, a relação do trabalhador/usuário, seja na atenção primária, seja no campo das especialidades, é regida por um tempo cada vez menor, fazendo com que o momento clínico, que seria o espaço para aprofundar a aprendizagem (já que é um tempo de aberturas afetivas e cognitivas para poder assumir o prescrito de uma maneira experiencial), está totalmente condicionado pelo tempo objetivo da consulta. E antes de ser um encontro entre trabalhador e usuário, parece mais seguir a forma médico/paciente do citado modelo. Assim, partimos de um imprescindível resgate do espaço para a palavra e para um efetivo encontro com o outro. Aprender na experiência da troca com o outro que nos interpela e que também é interpelado. Produzir saúde em um encontro no qual o saber experto tenha tanto valor quanto o saber constituído a partir da experiência do padecimento. E a ferramenta do AT nos permitiu constituir este tempo outro para a escuta. Ao circular pelo tecido social, por vezes inclusive em busca de um atendimento, de um direito, o(a) articulador(a) social escutou e vivenciou junto com as mulheres esse itinerário. Conectou palavra e ação, rompendo com o instituído fazendo emergir possibilidades para o instituinte. Além do tempo para a palavra, para o encontro, foi preciso tomá-la realmente como um saber produzido em primeira pessoa por quem nos enuncia sua narrativa, sua história: escutar o saber da usuária sobre seu próprio processo, as escolhas que fez ao longo da vida, os itinerários que percorreu em busca de ajuda, de uma suposta cura ou solução para o seu problema; tomar os saberes profanos (estes produzidos a partir da experiência do padecimento) como parte fundamental do processo de análise das condutas a serem propostas pelas equipes à usuária. Outra importante face dessa intervenção foi a comunicação e intermediação entre os diversos mundos culturais, de trabalhadores, gestores, ativistas sociais e as mulheres acompanhadas. Uma produção de cuidado e cidadania também a partir da proposição de uma forma de relação singular entre os atores envolvidos no processo, colocando em simetria o discurso nativo e o discurso do experto. Enquanto terapéutica e produção política, recorreu os cabedais teóricos que lhe sustentam, utilizando seu caráter de especialidade, mas sempre reconhecendo o saber local ou os saberes profanos daqueles coletivos plurais. O desafio foi assumir uma postura de não saber frente aos atores em território, permitindo assim que a fluidez do encontro sem contaminação com o saber do especialista. Dessa maneira, a voz dos trabalhadores e, principalmente, das mulheres acompanhadas tiveram um papel fundamental na análise dos territórios existencias, nas potencialidades e na estruturação da própria intervenção. Todos os saberes ali colocados em pé de igualdade, justamente a partir de sua diversidade. Potencializar o encontro com a alteridade, favoreceu a criação do próprio encontro, da intervenção e, fundamentalmente, de outros futuros possíveis para todos os envolvidos.

5341 Um estigma secular na sociedade moderna: A violência contra a mulher no Brasil
Anna Ramos, Leonardo Maquiné, Gabriel Souza dos Santos, Beatriz Mella, Dayana Marques Pinto

Um estigma secular na sociedade moderna: A violência contra a mulher no Brasil

Autores: Anna Ramos, Leonardo Maquiné, Gabriel Souza dos Santos, Beatriz Mella, Dayana Marques Pinto

Apresentação: A violência contra a mulher abrange todo ato que possui como consequência a violação da integridade física, sexual e psicológica ou morte de mulheres. Enquadra-se em várias amplas categorias, realizadas por indivíduos ou por Estados. O trabalho possui como objetivo avaliar o cenário brasileiro em relação a este tipo de violência. Desenvolvimento: Estudo realizado através de consultas a dados oficiais governamentais e entrevistas a representantes de órgãos públicos responsáveis por auxílios e medidas que abrangem a saúde da mulher. Resultados: A população brasileira é de 203,2 milhões de habitantes, sendo 104,772 milhões (51,6%) composta por mulheres. 1 a cada 3 mulheres já sofreram algum tipo de violência no país. Em 2017, 22% das brasileiras sofreram ameaças verbais, o que corresponde à 12 milhões de mulheres. No mesmo ano, 10% sofreram violência física, 8% sofreram ofensa sexual e 4% foram vítimas de ameaças com armas brancas e/ou de fogo. Os índices revelam um quadro alarmante no país, demonstrando altos números de violação não só da constituição brasileira mas também dos direitos humanos. A violência contra a mulher, além de prejudicar diretamente a vida da vítima, contribui para o atraso do desenvolvimento socioeconômico e político das comunidades em que estão inseridas. Pesquisas indicam que apenas 11% das vítimas procuram uma delegacia da mulher ou órgãos similares para realização de denúncias e apenas 13% procuram auxílio familiar. As raízes históricas, associadas às ideologias predominantemente machistas no país dificultam a luta contra este tipo de violência. O agressor, em 61% dos casos, é um conhecido, dentre os quais, 19% são atuais companheiros das vítimas e 16% são ex-companheiros. Em 2017, cerca de 27,8 milhões de mulheres sofreram assédio físico em transporte público, receberam comentários desrespeitosos ou foram beijadas ou agarradas sem consentimento. Os índices de assédio são mais graves entre jovens de 16 a 24 anos. Das 20,4 milhões de vítimas de comentários desrespeitosos, 68% eram jovens com a idade na faixa citada acima. Considerações finais: A violência contra a mulher é uma questão social e de saúde pública, que atinge todas as camadas sociais e compromete o avanço em direção à igualdade entre gêneros. Ideologias segregacionistas e a lentidão judiciária quanto aos crimes contra a mulher contribuem para a perpetuação dessa prática. Avanços como a Lei Maria da Penha foram feitos nos últimos anos, no entanto, esforços conjuntos do poder público e dos diferentes setores sociais se demonstram essenciais para o combate a este tipo de violência e para a exerção do respeito mútuo.

2589 Sobre os desafios de produzir cuidado às mulheres em situação de vulnerabilidade social
Paula Monteiro de Siqueira, Laura Camargo Macruz Feuerwerker, Mariana Leite Hernandez, Lumena Almeida Castro Furtado, Harete Vianna Moreno, Heloisa Elaine Santos

Sobre os desafios de produzir cuidado às mulheres em situação de vulnerabilidade social

Autores: Paula Monteiro de Siqueira, Laura Camargo Macruz Feuerwerker, Mariana Leite Hernandez, Lumena Almeida Castro Furtado, Harete Vianna Moreno, Heloisa Elaine Santos

Este relato foi produzido a partir do processamento coletivo da experiência de trabalhadores pesquisadores no contexto da rua, vivenciadas em iniciativas tais como o Programa de Braços Abertos (DBA), Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), Consultório na Rua (CnaRua). Dentre muitos casos problematizados estão os de mulheres, a quem, por viverem uma situação de vulnerabilidade e em nome de uma suposta “proteção” à criança, têm sido negado o direito de viver sua maternidade. São mães órfãs de seus próprios filhos, sequestrados, muitas vezes antes mesmo da primeira mamada, em maternidades de várias cidades do país. A condição da mulher, negra, em situação de rua ou de grande vulnerabilidade social, associada ao uso de álcool e/ou outras drogas, tem sido um marcador para a ação violenta e conjunta de instituições como as da Saúde, da Assistência Social e Judiciário. O texto busca refletir sobre a relação entre o ato de cuidar e a produção de tutela e autonomia, central nesta situação em que, tanto o sequestro de bebês como a defesa do direito das mães de terem seus filhos podem ser exercidos no âmbito do cuidar em saúde. Nesse caso, a tutela outorgada ou conquistada pode estar relacionada a um agir castrador ou libertador, e o que está no cerne desse debate: qual é a centralidade do ato de cuidar. Este artigo se propõe a apresentar esta situação, refletir sobre ela, para ajudar a romper o silêncio, amplificar a denúncia e avançar na disputa por um cuidado que ajude a produzir mais vida. São mães órfãs de seus próprios filhos, sequestrados, muitas vezes antes mesmo da primeira mamada, nas maternidades de várias cidades do país. Um cordão umbilical arrancado com violência, interrompendo compulsoriamente esta relação. A relação mãe-filho(a) é reduzida à mãe-depositária, com quem o bebê só pode permanecer até o nascimento e, tão logo retirado de seu útero, entregue a equipamentos de “proteção”. Difícil refletir sobre esta situação sem referir a brutal situação de violência que submete a mulher e em particular a mulher em situação de rua. Ser mulher na rua é um desafio ainda mais intenso que para o homem. Muitas nos relatam não poder ficar sem um homem, pois sozinhas ficam mais vulneráveis às agressões masculinas. A escolha (ou aceitação) do parceiro pode ser uma decisão por segurança, antes de uma decisão afetiva. Em muitas situações, a ação conjunta da saúde, da assistência social, dos Conselhos Tutelares, tem o respaldo explícito do poder Judiciário. Entretanto, ações como as registradas neste texto não se restringem às maternidades de municípios em que há estas recomendações formais do Ministério Público ou do Judiciário, são práticas recorrentes em muitos outros lugares. Alguns buscam revestir tais ações violentas de alguma legitimidade institucional em nome da proteção da criança, alegando prerrogativas a partir do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O ECA, que em muitas situações foi e é fundamental para defender e garantir o direito das crianças e viabilizar seus direitos sociais, neste caso, tem sido apropriado por forças que o usam como dispositivo para negar o direito de mulheres à vida que elas poderiam produzir/construir como mães de seus novos filhos. Dessa forma, percebemos que, dependendo da força que se apropria de um problema ou de um conceito - no caso o ECA -, são diferentes os valores produzidos.  Direitos de uns, supostamente contra direitos de outros, todos sem voz ativa, assujeitados. Em diversas oportunidades, diretrizes e fluxos visando a atenção integral à saúde das mulheres e das adolescentes em situação de rua e/ou usuárias de crack/outras drogas e seus filhos(as) recém-nascidos foram reivindicados pelos movimentos sociais e discutidos por órgãos governamentais, como o Ministério da Saúde (MS) e o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS). Foi reconhecida a necessidade do protagonismo dos Sistemas Único de Saúde (SUS) e Assistência Social (SUAS) no acompanhamento a este público devido à complexidade de suas necessidades. Propôs-se como fundamental nortear as ações dos gestores e profissionais de saúde uma vez que decisões imediatistas, como por exemplo, a retirada dos bebês das mães,  acabam por violar os direitos das mulheres, bem como da criança, causando danos irreparáveis à ambos. Recomendou-se o acompanhamento integrado antes, durante e depois do nascimento, de modo que a avaliação das condutas fosse feita caso a caso, respeitando assim as singularidades. (BRASIL, 2016). No entanto, é claro que, em função da complexidade das situações e das intensas disputas ético-políticas em torno do tema, recomendações, por mais acertadas que sejam, não são suficientes para produzir os enfrentamentos necessários para defesa, no caso, dos direitos das mães e das crianças. Está em questão um julgamento moral sobre quem tem e quem não tem direito de ser mãe, o que autoriza o emprego da violência contra “uma vida que não vale a pena” em nome de outra a ser protegida, sem muita reflexão sobre os efeitos dessa separação violenta tanto sobre a “vida que não vale a pena”, como sobre a vida que supostamente está sendo defendida. Por isso mesmo existe um silêncio cúmplice em torno dessa violência! Cuidar de modo conectado com a produção da vida, nas cenas acima,  coloca como necessidade fundamental a criação de uma rede de apoio para poder enfrentar estas situações violentas. Para isso é preciso problematizarmos a forma como estamos produzindo o cuidado na saúde, pois muitas vezes pautamos a gestão do cuidado no território de forma protocolar, baseada em padrões normativos de comportamentos. Sem levar em conta que para além dos padrões há uma vida que é produzida pelo usuário, que dificilmente consegue ser considerada na orientação produzida pelos trabalhadores de saúde. Algumas falas de profissionais em serviços em que se realiza o pré natal trazem fortemente este preconceito: “a concepção este grupo está fazendo muito bem”, “não vai fazer controle, vai perder as medicações, etc.” Falas que fazem um juízo moral da situação da gravidez em si e colocam na mulher a responsabilidade por “aderir ou não “ao que é agendado, programado para seu acompanhamento, sem preocupação em compartilhar um plano de cuidado conforme suas necessidades /possibilidades. Além de todos os direitos que foram negados a essas mulheres na construção do lugar que ocupam hoje, agora a subtração de um direito central: o de ser mãe, o de viver a maternidade. Mesmo que se diga que a condição socioeconômica não é motivo para retirada do pátrio-poder, para a mulher em situação de rua este tem sido um caminho sem volta.   

4947 A prática do assédio moral e seus desdobramentos sobre a saúde: um relato de experiência clínica na cidade de Manaus/AM
Giselle Maria Menezes da Silva

A prática do assédio moral e seus desdobramentos sobre a saúde: um relato de experiência clínica na cidade de Manaus/AM

Autores: Giselle Maria Menezes da Silva

Este relato de experiência tem como objetivo identificar as práticas de assédio moral e apresentar as consequências diretas e indiretas destas práticas sobre a saúde da vítima. Os dados foram obtidos a partir da análise de um caso clínico do setor de Psicologia do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador – CEREST –. Os CERESTs são órgãos públicos que promovem ações voltadas para a melhoria das condições de trabalho e qualidade de vida dos trabalhadores através da prevenção e vigilância. No Amazonas, o CEREST conta com a atuação de psicólogos voluntários que prestam atendimentos psicoterápicos breves aos trabalhadores em sofrimento psíquico, a fim de retirar o paciente de uma crise emocional aguda. A vítima, cujo nome fictício é Maria, é servidora pública na cidade de Manaus/AM, profissional da área de Comunicação, 47 anos, casada, mãe de 3 filhos, graduada em Comunicação Social, Mestre em Economia e Doutoranda em Biodiversidade e Biotecnologia da Amazônia Legal. Compareceu ao CEREST em busca de orientações jurídicas e auxílio psicológico devido a situações vivenciadas no trabalho. O processo terapêutico teve duração de 3 meses, perfazendo 13 sessões. Na primeira sessão, Maria apresentou os laudos psiquiátricos com os diagnósticos F 32.11 – Episódio depressivo moderado – e F 41.0 – Ansiedade paroxística episódica – estando afastada de suas atividades havia 10 dias. Durante as sessões seguintes, relatou sofrer os assédios desde meados de 2011, momento em que se negou a apresentar indicadores com base em dados falsos para a Sede da empresa, alocada em Brasília – DF. A partir deste momento, passou a ser evitada por alguns colegas e impedida de participar de eventos e atividades internas da empresa sem qualquer justificativa. Explica que começou a sentir sentimentos de solidão e tristeza, face ao descaso e abandono aos quais estava sendo submetida. Percebeu que suas iniciativas eram podadas e pouco a pouco foi sendo impedida de realizar atividades diretamente relacionadas ao escopo de sua função. No ano de 2012, o Sindicato apurou uma série de denúncias anônimas feitas à Empresa, dentre elas a de maus tratos aos trabalhadores, denúncia esta que obteve grande repercussão local. Como egressa do Ministério Público Federal, Maria foi imediatamente relacionada à autoria das denúncias. Deste momento em diante, passou a ser fortemente discriminada e perseguida. Relata que em uma ocasião, um dos motoristas da empresa atirou a condução que dirigia sobre o carro que dirigia afim de intimidá-la. Explica que passou a ter sentimentos de terror em dirigir para o trabalho. Tremores, palpitações, suor frio e medo foram alguns dos sintomas característicos de ansiedade que a paciente relatou ter sentido. Ainda em 2012, iniciou tratamento Psiquiátrico para Transtorno de Ansiedade e Depressão. A partir deste ano, os assédios se intensificaram. Sofreu boicotes aos seus projetos, retaliações e ataques das formas mais diversas. Teve seu computador de trabalho invadido e relatou que frequentemente deparava-se com objetos sujos sob sua mesa pela manhã, ao chegar no trabalho. Em conversa informal, alguns colegas revelaram à paciente sentirem receio de sofrerem retaliação por parte da Gestão por serem vistos conversando com ela. Maria então passou a não mais frequentar as áreas comuns da Empresa e frequentemente encontrava-se sozinha nos horários de café da manhã, almoço e lanche. No mês de abril de 2017, após cinco anos de práticas assediadoras decorrentes, a paciente, sob forte estresse, sofreu um surto no local de trabalho e foi imobilizada por um de seus Chefes com força desproporcional, o que ocasionou o surgimento de grandes hematomas em seus braços. Após este acontecimento, relata que teve recidivas de episódios de Pânico e humor depressivo. Maria recebeu em sua casa, durante o período de afastamento, uma notificação pedindo que se defendesse no período de oito dias da alegação de calúnia e difamação de colegas durante o surto. A paciente redigiu a defesa e ao fazer isso, reviveu os momentos passados durante o ocorrido, o que culminou em uma piora dramática de seu estado emocional agravando os sintomas depressivos e ansiosos. Como consequência, Maria relatou estar passando por período de instabilidade na relação familiar, com prejuízos no relacionamento conjugal e no desempenho escolar dos filhos menores. Apresentou sentimento de culpa e vergonha por não estar conseguindo desempenhar os papéis de esposa e mãe de maneira satisfatória devido sua atual condição. Os compromissos e interações sociais começaram a ser frequentemente evitadas, de modo que a paciente já não mais sentia-se disposta a comparecer em programações com familiares e pessoas próximas. A exploração sistemática dos sintomas psíquicos revelou lentidão no curso do pensamento, fuga de ideias, memória verbal de curto prazo prejudicada, insônia, pesadelos, pânico, ansiedade, frigidez, tristeza, angústia, anedonia e agitação psicomotora. Foi registrado ainda o aparecimento de distúrbios gastrointestinais durante o período. Durante os primeiros encontros, as intervenções clínicas estiveram focadas em medidas educativas acerca do Assédio Moral, suas consequências e danos à saúde, considerando que a paciente apresentou sentimentos controversos de culpa. Como parte do caráter educativo da psicoterapia, a paciente recebeu orientações acerca dos procedimentos burocráticos e órgãos responsáveis para formalizar denúncia tão logo seu quadro clínico obtivesse melhora. Após o primeiro momento de elaboração das experiências vividas, o processo interventivo da clínica voltou-se para o desenvolvimento de estratégias de enfrentamento e elaboração de um plano de emergência visando a evitação dos agentes estressores. Após perfazer 13 sessões, a paciente apresentava-se em processo de melhora, momento em que houve o encerramento do processo psicoterápico. Maria então, integrou-se a um grupo de apoio a mulheres vítimas de Assédio Moral para manutenção contínua da melhora. Á guisa de conclusão, pode-se observar o aparecimento de descompensação de natureza psicológica e psicossomática decorrentes do processo de assédio moral que afetaram de maneira substancial a qualidade de vida da paciente. Além de consequências sobre a saúde da vítima, a prática do assédio moral leva a degradação do ambiente de trabalho, podendo conduzir em alguns casos à ruptura do contrato de trabalho, o que por muitas vezes traz consequências diversas, tais como perturbações de ordem financeira, social e pessoal. Considerando tais consequências degradantes às vítimas, cabe a cada ator social agir de maneira efetiva para coibir ou reduzir as ocorrências da prática do assédio moral, sobretudo os trabalhadores e empresas ao optarem por modelos de Gestão que privilegiem a figura do trabalhador e preservem sua dignidade.