Anais

Anais do 14º Congresso Internacional da Rede Unida
Revista Saúde em Redes, v. 6, supl. 3 (2020) – Editora Rede Unida
ISSN 2446-4813 DOI 10.18310/2446-48132020
http://revista.redeunida.org.br/ojs/index.php/rede-unida/issue/view/65
 

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Anais do 14º Congresso Internacional da Rede Unida. Saúde em Redes, v. 6, supl. 3 (2020). ISSN 2446-4813.
Trabalho nº 8930
Título do Trabalho: BARREIRAS E ESTRATÉGIAS PARA MELHORIA DO ACESSO À ATENÇÃO PRIMÁRIA A SAÚDE EM MUNICÍPIO RURAL REMOTO DO SEMIÁRIDO BAIANO
Autores: Jéssica de Oliveira Sousa, Patty Fidellis de Almeida, Adriano Maia dos Santos, Fabiely Gomes da Silva Nunes, Jôsi Ribas Galvão

Apresentação: O presente resumo deriva da experiência em campo referente à pesquisa “Atenção Primária a Saúde em zonas rurais remotas do Brasil” coordenada pela ENSP/FIOCRUZ, realizada em quatro regiões do país (norte, nordeste, centro-oeste e sudeste). O Nordeste foi representado por quatro municípios localizados no semiárido, dentre eles um no Piauí e três na Bahia. Este resumo refere-se à realização do trabalho de campo em maio de 2019 no município baiano Morpará, classificado como rural remoto segundo tipologia do IBGE. O objetivo é analisar as principais barreiras encontradas para o acesso à Atenção Primária à Saúde (APS) e as estratégias utilizadas para minimizá-las. Desenvolvimento: Morpará (BA) localiza-se a uma distância média de 720 km da capital do estado, apresentando uma população em torno de 8.000 habitantes. Apresenta 100% de cobertura da Estratégia de Saúde da Família, representada por duas unidades localizadas na zona rural do município e uma na sede. O município dispõe ainda de uma unidade mista com funcionamento 24 horas e uma base do SAMU 192, localizadas na sede. Os serviços de APS destacam-se como o serviço de referência de primeiro contato da população, tanto na zona urbana, como rural, configurando-se como local de busca regular. No caso da zona rural é o único serviço disponível. Na sede, uma segunda opção de porta de entrada é o hospital (unidade mista), buscada tanto por moradores da sede, quanto também da zona rural, por livre demanda. A unidade mista serve também de apoio ás demais UBS quando as equipes de saúde da família encontram-se sem médicos. Nestes casos, o profissional de enfermagem realiza os atendimentos e referencia para a unidade mistas aqueles casos que necessitam de avaliação médica. No que se refere aos tipos de barreiras para o acesso da população à APS, destacam-se as geográficas, organizacionais e financeiras, todas com maior impacto na área rural do município rural remoto. O acesso a Morpará já se constitui uma barreira geográfica, pois é realizado via estrada de chão. O acesso às zonas rurais do município também ocorre por estradas sem pavimentação, sendo relatado que famílias ficam isoladas em período de chuvas, com dificuldades de acesso à UBS rural, localizadas a até 40 km de localidades para as quais são referência. Não há transporte público para acesso à sede do município, porém é garantido transporte para o médico da UBS rural. A enfermeira vive em uma casa mantida pela prefeitura, na zona rural, sendo referência para a população a qualquer hora do dia e da semana, embora a prática do “sobreaviso” não esteja formalmente instituída. Por esse motivo, essa profissional acaba ampliando suas funções, desenvolvendo práticas, que em condições ideais de trabalho não seriam realizadas, como a administração de medicamentos orais e venosos sem prescrição médica, instalação de oxigênio e realização de nebulização quando necessário. A organização do processo de trabalho das UBS não foi uma barreira de acesso. A maioria dos entrevistados, entre usuários e profissionais, relatou que sempre que precisavam eram atendidos, que dificilmente havia recusa. Profissionais da APS reconheciam as dificuldades para acessar as UBS e mencionaram sempre atender à demanda espontânea, sobretudo dos usuários que vivam nas áreas mais distantes da zona rural. O Programa Mais Médicos (PMM) foi muito bem avaliado por gestores e profissionais. A ruptura ocorrida com a saída dos médicos cubanos no final do ano de 2018, deixou a UBS rural cerca de quatro meses sem este profissional, ocasionando sobrecarga do enfermeiro e aumento da demanda na unidade mista. No momento da pesquisa (maio de 2019), a UBS rural operava com um médico do PMM formado no exterior. Uma das barreiras financeiras de acesso à APS relacionava-se aos gastos com transporte, já que não existe transporte público no município. Na sede é comum o deslocamento para a UBS à pé ou por veículo próprio. Na zona rural acontece da mesma forma, a maioria das pessoas se desloca até a UBS a pé, de veículo próprio ou às vezes fretado. O maior gasto relatado foi com o transporte da zona rural para sede do município, para o qual precisavam pagar um carro particular. Na área rural, há falta de transporte coletivo regular da prefeitura, existindo apenas o transporte escolar que, informalmente, dá carona aos moradores dos povoados até a sede do município. Aliás, a necessidade de transporte, seja da zona rural para a sede ou do município para as cidades de referência para atenção especializada e hospitalar representa um gasto expressivo para usuários e para o município. Uma dessas estratégias municipais é o pagamento de carros particulares de moradores da própria localidade rural que ficam de sobreaviso para realizar o transporte de pacientes para a unidade mista na sede do município em dias e horários que a UBS da localidade esteja fechada. Em casos de maior urgência, que não esteja previamente agendado, o dono do veículo precisa entrar em contato com a gestão explicando a situação, para não correr o risco de fazer o transporte e não ser ressarcido. A intermitência na oferta de medicamentos, além da descontinuidade terapêutica, também gerava gastos adicionais para as famílias. Resultado: O conhecimento da realidade vivida por populações residentes em áreas rurais remotas na busca por saúde evidencia que o local de residência define o ter ou não acesso a serviços de saúde. Populações residentes em municípios que estão localizados distantes dos grandes centros sofrem maiores dificuldades de acesso, sobretudo se vivem nas áreas rurais de municípios que já são considerados rurais e remotos. Considerações finais: Por isso faz-se necessário o reconhecimento das singularidades da ruralidade brasileira para o alcance da efetividade das políticas públicas de saúde, e reconhecendo a centralidade da APS no sistema de saúde, entende-se que ela precisa estar estruturada nesses municípios de uma forma que seja capaz de reduzir as iniquidades. Destaca-se a necessidade de políticas para garantia de transporte, para além do TFD, mas também o êxito de políticas públicas recentes como o PMM para a atração e fixação de médicos em municípios rurais e remotos.