Anais

Anais do 14º Congresso Internacional da Rede Unida
Revista Saúde em Redes, v. 6, supl. 3 (2020) – Editora Rede Unida
ISSN 2446-4813 DOI 10.18310/2446-48132020
http://revista.redeunida.org.br/ojs/index.php/rede-unida/issue/view/65
 

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Anais do 14º Congresso Internacional da Rede Unida. Saúde em Redes, v. 6, supl. 3 (2020). ISSN 2446-4813.
Trabalho nº 9614
Título do Trabalho: A ATUAÇÃO DO AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE EM MUNICÍPIOS RURAIS REMOTOS DO SEMIÁRIDO: UM OLHAR A PARTIR DOS ATRIBUTOS DA APS
Autores: Jéssica de Oliveira Sousa, Patty Fidelis de Almeida, Adriano Maia dos Santos, Fabiely Gomes da Silva Nunes, Jôsi Ribas Galvão

Apresentação: A função de Agente Comunitário de Saúde (ACS) no Brasil tem suas raízes no nordeste do país, mais especificamente no Ceará, onde no ano de 1987 no período de seca severa, mulheres foram recrutadas para auxiliarem no combate à mortalidade infantil. A partir do êxito dessa experiência, o Ministério da Saúde expandiu essa estratégia para todo o Brasil no ano de 1991 com a criação do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS), que posteriormente passou a integrar a Saúde da Família, fazendo parte dessa Estratégia até os dias atuais. A partir de sua incorporação ao Programa Saúde da Família (PSF), o ACS que tinha suas ações mais focadas no público materno infantil, teve seu escopo de práticas ampliado, sendo sua função caracterizada segundo a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) pelo exercício de atividades de prevenção de doenças e promoção da saúde, mediante ações domiciliares e comunitárias. Ainda assim, por seu potencial em intermediar, aproximar, traduzir e com isso vincular a população à equipe/unidade de saúde, o ACS é amplamente reconhecido como o elo de ligação entre esses dois polos, tendo, muitas vezes, toda sua função resumida a essa concepção. Neste estudo, nos interessou caracterizar as ações do ACS para além da função de “elo”, desvelar quais são suas ações tendo como parâmetro para análise os atributos essenciais e derivados da APS segundo Starfield (2002). Temos como pressuposto que, em municípios rurais e remotos do Brasil, o ACS apresenta funções mais fortemente direcionadas aos atributos essenciais da APS como porta de entrada, atenção integral, coordenação e continuidade do cuidado, se comparados àqueles mais voltados à atuação comunitária. O presente trabalho apresenta parte do estudo “Atenção Primária a Saúde em zonas rurais remotas do Brasil” coordenada pela ENSP/FIOCRUZ, realizada em municípios rurais remotos do Brasil segundo classificação do IBGE (2017), localizados no norte, nordeste, centro oeste e sudeste do país, distribuídos em seis regiões, norte das águas, norte das estradas, norte de minas, matopida e semiárido. Analisou-se dados dos municípios representativos da região do semiárido nordestino, dentre eles Rio Grande do Piauí (PI), Morpará (BA), Ipupiara (BA) e Pilão Arcado (BA), cujo trabalho de campo foi realizado no ano de 2019. Os resultados indicaram que o ACS se destacou na função de primeiro contato na busca por respostas às demandas de saúde, coordenação do cuidado, garantia de atenção integral e longitudinal. Ser o primeiro contato foi uma característica muito encontrada nesses municípios principalmente no interior, em função da distância das Unidades Básicas de Saúde (UBS) ainda que estivessem localizadas na própria área rural. Nesse contexto, os ACS eram os primeiros a serem procurados frente a alguma demanda de informação/orientação, marcação de consultas/exames e mesmo em casos de agudização de alguma patologia. Os ACS eram procurados também à noite e nos fins de semana, pois eram os únicos representantes da saúde no território. O ACS intermediava a marcação de consultas médicas, de enfermagem e odontológicas na UBS, pois recebiam um número de vagas para distribuir à população de referência. Tal estratégia, ao mesmo tempo, facilitava o acesso dos usuários evitando deslocamentos em locais de grande dispersão, mas delegava grande poder ao ACS no manejo de recurso bastante estratégico. Outra marcação intermediada pelo ACS era o de consultas/exames especializados. Em geral os usuários tinham que se deslocar até a Secretaria Municipal de Saúde (SMS), na sede do município, para realizar o agendamento. Em alguns casos, o ACS reunia todas as solicitações de sua microárea e levava à SMS. Quando as consultas ou exames eram agendados, a maioria dos ACS acompanhava o paciente até o local da realização, e, em alguns casos, acompanham suas gestantes até o hospital no momento do parto. Em um dos municípios, o ACS intermediava a marcação de consultas/exames oftalmológicos em uma ótica privada, referindo conseguir preço mais acessível para seus pacientes. Em relação à coordenação do cuidado, além do acompanhamento desses pacientes em consultas, os ACS também facilitavam o fluxo de informações quando o usuário retornava de algum outro ponto da rede, na ausência de comunicação formal entre APS e a rede especializada. Foi referido também que os ACS dessas áreas realizavam procedimentos no domicílio como aferição de pressão arterial, glicemia capilar, temperatura axilar, realização de curativo, retirada de pontos e administração de medicações na sua rotina diária, realizando até outros procedimentos como repetição de prescrição médica e nebulização, em casos cujo deslocamento para o hospital ou UBS eram urgentes. Nos municípios rurais remotos, os ACS, principalmente os que atuavam na zona rural, apresentaram escopo de práticas ampliado, eram reconhecidos como principal ponto de contato com os serviços de saúde, realizavam fluxo informacional, que, de certa forma, possibilitava algum acompanhamento longitudinal pela equipe de saúde da família. Interessante ressaltar que ações comunitárias, de intervenção mais coletiva e promocional no território praticamente não foram referidas. O estudo indica que o ACS, em contexto de municípios rurais e remotos, tem uma atuação importante na garantia de acesso à APS e demais níveis de atenção, com escopo de práticas que incorpora, inclusive, ações de enfermagem, alguma das quais previstas na PNAB de 2017, sob supervisão e em contextos específicos. Por outro lado, percebe-se arrefecimento das ações promocionais, de caráter coletivo, em territórios que apresentam um conjunto de vulnerabilidades sociais. Em momento no qual as novas diretrizes da política de saúde relativizam a presença do ACS nas equipes básicas, o contexto dos municípios rurais remotos parecem indicar que sua ausência poderia enfraquecer o desempenho dos atributos essenciais da APS. A garantia do ACS nessas realidades de grande vulnerabilidade demonstra-se extremamente necessária, não devendo a existência desse profissional ser uma decisão deixada a cargo da gestão local, devendo ter sua permanência garantida como um dos componentes mínimos obrigatório das equipes de saúde e em quantidade suficiente para cobrir 100% da população. É importante salientar, que as atribuições desse profissional na APS carecem de melhor elucidação, sem, no entanto, prescindir de sua presença.